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O discurso privatista contra a Petrobras e os burros n’água

Marcos Jr. [1]

Que a privatização da Petrobras que completou sete décadas de existência em outubro passado [2] era o sonho de consumo do projeto liberal-conservador de Bolsonaro, não se tratava de nenhuma novidade, posto que Adolfo Sachsida, ex-Ministro de Minas e Energia no governo anterior confessou isso com todas as letras em entrevista ao Estadão no ano passado [3]. Aliás, esta privatização já estava ocorrendo de forma fatiada nos últimos anos, sendo que entre 2019 e 2022 ocorreu, para além da venda de diversas refinarias, a venda do controle da BR Distribuidora [4] (que se iniciara ainda na gestão Temer), desarticulando toda uma cadeia que pela natureza do setor, é – e precisa ser – altamente verticalizada.

Também não é novidade que, a despeito do discurso privatista que grassou – e ainda grassa – em setores da imprensa e nas redes sociais (e, cabe ressaltar, por mais que os bolsonaristas detestem a Rede Globo, seu discurso econômico difere desta apenas em dose, e olhe lá), em que é exaltada a frugalidade e a eficiência do setor privado frente ao público, dado que a realidade se revela de outra forma [5]: concessionárias privadas deixando cidades importantes às escuras por dias a fio após tempestades, rodovias pedagiadas que seguem sem melhorias por vários anos, ou ainda, pensando no caso específico que iremos abordar, combustíveis mais caros – contrariando a promessa de redução nos preços – em refinarias privatizadas, na prática a teoria mostra-se diferente.

Em vista disso, uma pesquisa [6] feita pelo PoderData [7] entre os dias 27/1 (vinte e sete de janeiro) e 29/1 (vinte e nove de janeiro), e publicada pelo jornal Poder360 [8] na última quinta-feira, 1º/2 primeiro de fevereiro, mostra um resultado bem interessante: apenas 27% (vinte e sete) dos entrevistados apoiam a privatização da Petrobras. Já 57% (cinquenta e sete) desses, uma clara maioria, defendem que esta continue sendo estatal. Esta defesa é majoritária em quase todas as regiões do país (a exceção da região Sul, mas mesmo por lá 48% (quarenta e oito) são favoráveis a manter a petrolífera estatal, contra 24% (vinte e quatro) que apoiam a privatização e em todas as faixas de renda. E mesmo entre aqueles que desaprovam o governo Lula do partido (PT), a despeito do contingente de favoráveis à venda do controle da companhia ser maior 46% (quarenta e seis), o de contrários é bastante expressivo 39% (trinta e nove).

Trata-se, portanto, de uma questão que praticamente atravessa os matizes regionais, de renda e mesmo de posicionamento político, e está em linha com o fato de que, a despeito de um discurso privatizante que ganhou força nos últimos dez anos – em parte, ajudada pela má gestão de agentes do Estado brasileiro (e é preciso que se admita esse ponto) – tanto na imprensa como nas redes sociais e da participação intensiva de think tanks [9] como o Instituto Millenium [10] e o Instituto Mises Brasil [11] nesse processo (não se pode negar que até conseguiram avançar nisso), a resistência às privatizações continua forte no Brasil, conforme mostram levantamentos feitos pelo Datafolha em 2022 [12], último ano do governo Bolsonaro, e em 2023 [13], primeiro ano de Lula.

Disso podemos inferir que leituras políticas como a de Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), atual governador de São Paulo, que alegou que “não aceitar privatizações é não aceitar o resultado das urnas” [14] por ocasião da greve dos metroviários ocorrida ano passado, soam um tanto míopes, como se o eleitor desse um “cheque em branco” ao mandatário eleito. Muitas vezes – sobretudo em segundo turno de eleições – vota-se no “menos ruim”, pesando uma série de fatores favoráveis e contrários.

No caso do certame paulista do ano retrasado, entre o (ainda) bolsonarista Tarcísio e o petista Haddad há muitos eleitores do primeiro que o escolheram não (tanto) pela defesa de privatizações, mas – talvez – pela defesa de uma polícia mais combativa ao crime, por exemplo (sem falar na histórica resistência do interior paulista ao petismo). E se observarmos a última disputa presidencial o resultado tão apertado em favor do retorno de Lula ao Planalto se deve ao fato de que, se por um lado os petistas defendiam alguma ação mais enérgica do Estado na economia (o que era, em certo grau necessário), por outro, junto ao pacote vinha um incômodo identitarismo por exemplo. E se Bolsonaro tinha como trunfo o conservadorismo nos costumes, por outro o espontaneísmo de mercado defendido pelo seu governo para resolver as questões econômicas pesava contra, como de fato pesou.

Enfim, a despeito de tudo e de mais um pouco, o nosso povo ainda possui algum senso de autopreservação. Cabe a nós nos movimentarmos para defender um importante agente de nossa soberania energética.

[1] Formado em Engenharia de Produção e servidor público

[7] O PoderData é uma subsidiária do Grupo de Comunicação Poder360. É uma empresa de pesquisas de opinião que produz estudos de conteúdo jornalístico publicados pelo Poder360, pela newsletter Drive e/ou por parceiros que contratam esses levantamentos. Disponível em: https://www.poder360.com.br/poderdata-institucional/

[8] O Poder360 é um grupo de comunicação jornalística. Seu propósito é aperfeiçoar a democracia ao apurar a verdade dos fatos para informar e inspirar. Disponível em: https://www.poder360.com.br/quem-somos/

[9] Um laboratório de ideias, centro de pensamento, instituição de pesquisa composta por especialistas que realizam investigações e defesas sobre temas especializados como: política social, estratégia política, economia, assuntos militares, de tecnologia e cultura. Algumas think tanks são ONGs, outras são agências semiautônomas tendo laços com o governo, partido políticos, empresas ou militares. Conforme DICKSON, Paul. Think Tanks. New York: Ballantine Books, 1972,

[10] Exemplo de think tank. Nosso objetivo é colocar a sociedade no centro das discussões sobre políticas públicas. Por meio de dados, estudos embasados em pesquisas científicas e evidências, buscamos promover um debate mais maduro e qualificado, capaz de identificar soluções efetivas para os desafios econômicos e sociais do Brasil. Disponível em: https://institutomillenium.org.br/sobre/

[11] Exemplo de think tank. O Instituto Ludwig von Mises Brasil (“IMB”) é um think tank voltado à produção e à difusão de estudos econômicos e de ciências sociais que promovam os princípios de livre mercado e de uma sociedade livre. Disponível em: https://mises.org.br/quem-somos

O IMB acredita que nossa visão de uma sociedade livre deve ser alcançada pelo respeito à propriedade privada, às trocas voluntárias entre indivíduos, e à ordem natural dos mercados, sem interferência governamental. Portanto, esperamos que nossas ações influenciem a opinião pública e os meios acadêmicos de tal forma que tais princípios sejam mais aceitos e substituam ações e instituições governamentais que somente:

a) protegem os poderosos e os grupos de interesse,

b) criam hostilidade, corrupção, e desesperança,

c) limitam a prosperidade, e

d) reprimem a livre expressão e as oportunidades dos indivíduos.

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