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Mudanças climáticas e seus impactos para a defesa nacional, a segurança e a soberania

De acordo com o professor Rubens Duarte, do Instituto Meira Mattos/ECEME, a temática das mudanças climáticas não recebe a devida atenção nos documentos relacionados à defesa, como o LBDN (Livro Branco de Defesa Nacional), a PND (Política Nacional de Defesa) e a END (Estratégia Nacional de Defesa).

Para Duarte, é fundamental afastar quaisquer impressões que sugiram a ausência de abordagens relacionadas às mudanças climáticas nos documentos de defesa desde uma leitura inicial. Desde a versão de 2005 da Política de Defesa Nacional, o tema é mencionado, destacando seus possíveis impactos ambientais, socioeconômicos e políticos, que resultam em uma crescente demanda da sociedade ao Estado. Apesar dessa constante presença, a abordagem do tema mantém um caráter protocolar, reconhecendo sua importância sem a profundidade necessária diante da complexidade e urgência da questão.

Ainda segundo o pesquisador, a situação se agrava a cada nova versão dos documentos, evidenciando uma tendência de redução do espaço dedicado às mudanças climáticas. Esse processo configura uma verdadeira amputação do conteúdo, retirando a substância da discussão e suscitando dúvidas sobre a motivação por trás da inclusão de frases vazias no texto. Isso abre espaço para críticas de que o tema persiste nos documentos apenas devido ao custo político de sua remoção completa, desempenhando assim um papel meramente protocolar.

Além desse progressivo esvaziamento, é importante destacar que a presença do tema não é uniforme nos três documentos em análise. Enquanto o LBDN e a PND tendem a abordar mais as mudanças climáticas, o mesmo não ocorre na END. A ausência de menções aos objetivos nacionais de defesa na PND e às ações estratégicas de defesa na END em relação às mudanças climáticas é simbólica. Isso não apenas reforça a percepção de uma abordagem protocolar, mas também sugere uma dificuldade ou desinteresse em transformar o reconhecimento da relevância das mudanças climáticas em ações e diretrizes concretas para mitigação ou adaptação.

Portanto, é evidente que há espaço para melhorias qualitativas nas considerações sobre mudanças climáticas nos documentos de defesa. Além do aprofundamento do debate para conferir substância aos documentos, é crucial empreender esforços para elaborar ações concretas que reflitam a urgência e complexidade dos impactos negativos das mudanças climáticas. Isso inclui tornar os documentos mais integrados e equilibrados entre si. A falta de ação nesse sentido pode perpetuar visões dentro das instituições responsáveis pela formulação e condução da política de defesa que não priorizem nem reconheçam adequadamente a gravidade das mudanças climáticas e suas consequências.

Duarte, quanto às forças armadas, descreve quatro dimensões relacionadas à atuação em relação às mudanças climáticas. São elas: 1) Prevenção das mudanças climáticas; 2) Alteração de valores e também de logística; 3) Emprego e preparo das Forças Armadas; 4) Adaptação aos novos cenários.

Citando exemplos estrangeiros, o autor afirma que Estados Unidos e China já atualizaram suas doutrinas militares com a inclusão de questões climáticas. A Espanha criou uma unidade militar de emergência ligada diretamente ao seu Ministério da Defesa. A Índia criou uma unidade especializada em mudanças climáticas com a composição de reservistas. Assim, para Duarte, o Brasil está largando atrás de tais países, pois embora exista um já reduzido espaço dedicado à prevenção às mudanças climáticas, não é discutido o impacto climático em questões orçamentárias, logísticas, de emprego e preparo das forças armadas, bem como também na adaptação aos novos cenários.

Conforme o pesquisador, predomina no Ministério da Defesa e nas Forças Armadas a percepção de que o clima é um pretexto para potenciais ameaças tradicionais. Tal visão partiria do ponto de que a real motivação das preocupações com o clima seria baseada em interesses de origem geopolítica por parte de alguns Estados Nacionais, sobretudo as grandes potências industrializadas. Todavia, embora a história esteja abarrotada de justificativas de nobreza para minar a soberania de outros países, tal percepção não deveria ser a única. Reduzir as mudanças climáticas a pretextos para ameaças tradicionais é o enfraquecimento da realidade científica de que o mundo aquece mais rapidamente como resultado de ações do homem.

Para Duarte, o Brasil precisa continuar desempenhando um papel fundamental nos foros internacionais, para que possa ser ouvido e também influencie na criação e manutenção de normas. Tomar posições que criem dificuldades para tal diálogo, pode fazer com que o Brasil perca o interesse de outros atores internacionais em ouvir o que o país tem a dizer sobre as mudanças climáticas e o desenvolvimento sustentável. Para o professor, é fundamental que os documentos nacionais de defesa reforcem o papel do respaldo ao multilateralismo, ao regionalismo e à cooperação internacional. Além disso, a dissuasão também é fortalecida quando as instituições nacionais se posicionam de maneira unida na postura internacional. Por conta disso, uma das sugestões de seu artigo é a aproximação entre o Ministério da Defesa e o Ministério das Relações Exteriores, posto que são as instituições responsáveis pela inserção internacional do Brasil, bem como pelo fortalecimento das posições e estratégias diplomáticas do país.

Fontes:


DUARTE, Rubens de S. “Mudanças Climáticas e Forças Armadas nos documentos oficiais de defesa”. Diálogos Soberania e clima. V.2 N.1. 2023. Disponível em: <https://soberaniaeclima.org.br/publicacoes/revista-dialogos/v-2-n-1-2023/>


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