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Jornadas de junho: 10 anos depois, qual o saldo?

Neste mês de junho, o Brasil atravessa um marco importante em sua recente história: os 10 anos do que ficou conhecido como “jornadas de junho”, ou, em uma nomenclatura menos pomposa, a “revolta dos 20 centavos”, devido à maneira como elas começaram: como movimentos contra o aumento das passagens de ônibus em São Paulo e Rio de Janeiro, em ambos os casos da ordem de 20 centavos.

A violência de determinados grupos entre os manifestantes – bem como a subsequente repressão policial – ajudou a fazer com que tais movimentos, inicialmente restritos a essas capitais, ganhassem força e capilaridade, atingindo todo o país. O fato de ocorrer em pleno período de Copa das Confederações – torneio de seleções organizado pela FIFA para testar a infraestrutura do país-sede da Copa do Mundo, que, no ano seguinte, seria no Brasil – e os primeiros sinais de enfraquecimento da economia brasileira, ainda no primeiro governo Dilma ajudou a transformar a “revolta dos 20 centavos” em um protesto “contra tudo que estava aí”: enfraquecimento da economia, escândalos de corrupção (e a Lava Jato ainda não estava grassando), gastos públicos com a Copa e a Olimpíada, entre outros.

Os desdobramentos deste evento tectônico na política brasileira foram variados – alguns deles refletindo até os dias atuais: de imediato, tivemos a revogação dos reajustes nas passagens de ônibus, que tinha sido estopim para os protestos. Além disso, diversas iniciativas legislativas deixaram de tramitar no Congresso Nacional, sendo substituídas em parte por outras medidas de maior apelo popular. Foi também naquele ano em que o transporte público entrou para o rol de direitos sociais que devem ser assegurados pela Constituição Federal, bem como tomou forma a direita e a esquerda em suas formas atuais.

Em 2014, ano da Copa, bem como nos anos seguintes, tivemos uma série de eventos disruptivos na política, economia e sociedade nacional: protestos do “Não Vai Ter Copa”; o segundo turno entre Dilma e Aécio, com a reeleição de Dilma após uma acirrada disputa; a recessão de 2015-16, em que a economia brasileira caiu mais de 7%; os protestos e o subsequente impeachment da então presidente; o interregno de Michel Temer, marcado por reformas, escândalos de corrupção, baixíssima popularidade e um governo cada vez mais à mercê do Congresso; a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro e a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada em circunstâncias ainda não totalmente explicadas; a eleição e o subsequente governo de Jair Bolsonaro, marcado por uma pandemia e tensões com o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF); a disputa eleitoral que culminou com o retorno de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência da República, após 12 anos do término de seu segundo governo e uma vitória ainda mais apertada; os protestos contra os resultados das eleições que desembocaram na tentativa de golpe de estado ocorrida em 08 de janeiro deste ano; entre outros.

Feito esse breve – brevíssimo, aliás – resumo dos acontecimentos dos últimos dez anos, fica a pergunta: o que tivemos de bom com tudo isso? Ou, reformulando a pergunta: qual o saldo dessas jornadas de junho e seus respectivos desdobramentos?

Se formos avaliar friamente os resultados econômicos, políticos e sociais, a resposta a essa pergunta pode ser pouco ou nada animadora. A começar pela economia: mesmo considerando o esfriamento do crescimento do PIB sob o primeiro governo Dilma, tratava-se de um desempenho razoável até então (4,0% em 2011, 1,9% em 2012 e 3,0% em 2013). O que viria depois oscilaria entre um crescimento medíocre e períodos agudos de recessão, como o já mencionado período de 2015-16 e o “coronacrash” de 2020.

Politicamente, o país alternou entre períodos de intensa catarse e igualmente intensa letargia (isso quando, paradoxalmente, não manifestou de forma simultânea as duas coisas): tivemos mobilizações de forma quase permanente desde então, com pouco – e, em certos aspectos, nenhum – retorno positivo. Tivemos um já mencionado impeachment, um governo com baixíssima popularidade, contestado nas ruas e refém do Congresso, um governo que o sucedeu bastante errático e com clara piora em diversos indicadores, sem falar uma condução desastrosa da crise sanitária decorrente da pior pandemia em 100 anos e, neste ínterim, um incômodo protagonismo – ainda que por vezes necessário – do Poder Judiciário.

Socialmente, como efeito das transformações do cenário econômico e político, o saldo de 2013 é igualmente pouco alvissareiro: além da piora do país em diversos indicadores, tivemos uma escalada de uma paralisante – e, em certos aspectos, perigosa – polarização política, cujos episódios extremos de violência ficaram claros e evidentes nos últimos anos. Outro aspecto não menos importante que cabe mencionar é a importação de problemáticas sociais norte-americanas, como, por exemplo, os ataques a escolas.

Sei que trata-se de um resumo do resumo tudo isso que disse, mas, olhando pelo retrovisor, há muito pouco – para não dizer nada – a se comemorar nestes dez anos das “jornadas de junho”. E, talvez, nosso país possa andar pra frente – em vez de andar de lado – se decidirmos por sepultar o volksgeist que está grassando nos últimos dez anos.

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