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Há algo de podre no reino do consumo

Atualizado: 15 de mai. de 2023

O início deste ano tem sido marcado por movimentações não tanto animadoras no campo dos negócios: a Americanas, uma das três gigantes do varejo – junto com Via e Magazine Luíza – e que foi tema de um artigo no mês passado, pediu recuperação judicial, por sinal uma das maiores da história; a Marisa, por sua vez, passou por uma série de renúncias em sua cúpula (incluindo a do diretor-presidente), em meio a uma reestruturação de uma dívida milionária; a Dok Calçados, dona de marcas como a Ortopé (quem nunca usou um calçado deles quando criança?), também pediu recuperação judicial após acusações de fraude – a propósito, é o que se atribui também à Americanas, primeira mencionada; e a Livraria Cultura, que já se arrastava há mais de quatro anos em uma recuperação judicial, parece que dará, de fato, seu último suspiro.

Afinal de contas, o que todas essas empresas, que pediram água ou simplesmente entrarão no descanso eterno (e, no caso da última, fazer a primeira coisa não necessariamente impede a segunda de acontecer), têm em comum? Basicamente, são empresas que vendem ou produzem bens de consumo. Consumo este que, entre a segunda metade dos anos 2000 e a primeira dos 2010, foi o indutor da última onda de crescimento da economia, bem como do último momento em que o Brasil chegou perto do pleno emprego.

No entanto, com a crise econômica de 2015-16, a lenta recuperação que ocorreu entre 2017 e 2019 e a subsequente pandemia, que deu um duro golpe nessa recuperação, o setor, nos diferentes pontos de sua cadeia (como exemplificado no início), se arrasta para ficar em pé. E os casos mencionados – que são só os mais notórios no momento – mostram que será um processo longo e doloroso, que remonta aos sombrios anos 90 e início dos 2000, em que várias grandes redes varejistas – entre elas Mappin, Mesbla e Arapuã – faliram.

Neste momento em que o varejo se encaminha para, usando as palavras de um amigo meu em um dos vários de discussões que participo nas redes sociais, voltar a ser um “cemitério de lojas”, é preciso repensarmos o modelo que adotaremos para a tão necessária retomada da economia. Tendo em vista que o problema no setor de bens de consumo dá sinais de ser sistêmico e mais intenso na ponta da oferta, pedir por medidas que estimulem o consumo (ou seja, a demanda), como adotadas no passado, nos levará à solução? Ou corremos o risco de repetir um voo de galinha – isso sem prejuízo dos efeitos colaterais disso – em vez de estabelecermos um ciclo de crescimento mais sustentado?

Parafraseando o personagem Hamlet, do escritor britânico Shakespeare, há algo de podre no reino do consumo por aqui. E não empregar o remédio correto apenas servirá para empurrar o problema, para termos que encará-lo ainda maior mais adiante.

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